Supervisão em enfermagem: o contributo das narrativas reflexivas no contexto clínico

Abstract

Na maioria dos Cursos de Licenciatura em Enfermagem em Portugal, o ensino clínico em contexto hospitalar acontece em alternância com a componente curricular em contexto académico e tem sido reconhecido como um período de elevado valor formativo, pela variedade e riqueza de aprendizagens realizadas. Contudo, a vivência dos estudantes em contexto hospitalar é também caracterizada pela ambiguidade, incerteza e conflitualidade, decorrentes da complexidade das situações com que se deparam, o que se faz sentir sobretudo no primeiro ano do curso. Torna-se, portanto, necessário recorrer a estratégias pedagógicas que favoreçam uma indagação sistemática dos processos de ensino e aprendizagem, através das quais se promova a autonomização progressiva dos estudantes e também uma avaliação da qualidade da formação, em particular da supervisão em contexto clínico. As narrativas profissionais associadas a outros processos formativos apresentam um elevado potencial de integração na profissão, levando os futuros profissionais de Enfermagem a adotarem um posicionamento reflexivo e crítico face ao próprio pensamento e ação, pelo enfoque na melhoria da qualidade das aprendizagens de todos os intervenientes, com reflexo na transformação dos contextos profissionais. Por outro lado, permitem ao formador/supervisor acompanhar os processos de desenvolvimento profissional dos estudantes e responder de forma mais adequada às suas expetativas, necessidades e interesses. O presente artigo apresenta uma experiência de supervisão de estágio realizada em contexto hospitalar, na qual participaram 17 estudantes do 1º ano do Curso de Licenciatura em Enfermagem a quem foi solicitado o desenvolvimento de uma narrativa reflexiva no decorrer de três semanas de ensino clínico. Essa narrativa assumiu o formato de diário de bordo e baseava-se num “roteiro de viagem” (Vieira, 2010) com um conjunto de tópicos de reflexão, designadamente os pontos de interesse (novos, controversos, interessantes, imprevistos…), os contratempos (problemas, dificuldades, dúvidas…) e, por fim, os avanços (aprendizagens, decisões, planos…). A análise de conteúdo dessas narrativas obedeceu aos pressupostos de Bardin (2008), com recurso ao software QSR NVivo 8.0. Dessa análise emergiram dimensões de âmbito profissional e organizacional relacionadas com a construção da identidade profissional. Concluiu-se que as narrativas podem constituir um dispositivo formativo que promove o questionamento de práticas racionalistas e tecnocráticas, criando espaços de reflexão partilhada nos quais os sujeitos se comprometem com a construção de aprendizagens significativas em contexto hospitalar.