Da obra audiovisual: questões de qualificação e de proteção

Abstract

Numa época em que a criatividade audiovisual tem um papel preponderante na sociedade moderna, é fundamental debruçarmo-nos sobre os direitos de autor, os direitos conexos e a propriedade industrial que materializam essa criatividade. Falamos sobre a necessidade de proteger as obras audiovisuais, que mais do que uma mera criação de um intelecto humano isolado, são também a conjugação de um conjunto de obras plurais, sejam elas de realização, literárias, fonográficas, visuais, gráficas, empíricas, decorativas e estilísticas que se reinventam através da sua unificação numa única obra apelidada de audiovisual. As obras audiovisuais são um veículo que reflete a matriz cultural de qualquer país desenvolvido, dada a importância que as mesmas têm na transmissão de valores, tradições sociais e culturais por serem o meio de comunicação preferencialmente utilizado a nível mundial. Mais do que considerarmos as obras audiovisuais como o motor de ignição da comunicação, devemos também ter em conta no presente estudo que este tipo de obras constituem as memórias do mundo que materializam um conjunto de contributos criativos únicos, que não poderão ser ignorados, enquanto marca e legado civilizacional que passa de geração em geração, e que permite que além da mensagem comunicacional intrínseca que transmitem, expressar a evolução/revolução em que todos nós estamos imbuídos. Embora seja claro e manifesto o interesse transnacional no tratamento do tema patente em toda a bibliografia mundial, no nosso país são escassas as referências às obras audiovisuais e o tema ainda é tratado com uma timidez enigmática, situação que apenas se justificará pelo desabrochar recente das produções audiovisuais nacionais, que só nos últimos trinta anos começaram a realizar-se com maior regularidade e frequência. Este estudo tem por objetivo saber se o Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, ao regular, no artigo 22.º, a obra cinematográfica, não estará a tomar a parte pelo todo e se não deveria existir uma regulamentação da obra audiovisual em geral, definindo-se dentro desta todos os seus tipos nos quais se inclui a obra cinematográfica. Indagaremos ainda se a obra cinematográfica será a obra audiovisual em si mesma ou apenas um dos tipos de obra audiovisual. A resposta a esta questão será essencial para posteriormente se definir se o regime de proteção das obras audiovisuais deve partir do paradigma das obras cinematográficas ou se, pelo contrário, deve partir de um conceito geral de obra audiovisual. Para isso vamos analisar cada um dos tipos de obras audiovisuais e o regime ou regimes que se consideram adequados para cada uma delas, de modo a saber se é possível a criação de um arquétipo de proteção para todas as manifestações de obra audiovisual, ou se deve partir-se da obra cinematográfica para que se possa criar uma ideia paradigmática deste tipo de obra. A inexistência de um conceito único e preciso de obra audiovisual, em geral, pode criar diversas lacunas no regime de proteção legal das obras audiovisuais. É ainda necessário perceber se é intuitiva a destrinça entre as diferentes obras audiovisuais que constituem um dos seus tipos e a obra audiovisual enquanto conceito geral. A correta identificação da obra audiovisual em si mesma também poderá permitir distinguir plenamente estas obras de obras que, apesar de diferenciáveis, são passíveis de serem confundidas com as obras audiovisuais ou então de obras que poderão estar na sua linha de fronteira. Verificaremos ainda se será necessário criar um regime de qualificação e de proteção para a obra audiovisual em geral, bem como para os seus diferentes tipos, no qual se analisem as vantagens e desvantagens da sua denominação como obras em colaboração, coletivas, originais e derivadas. Esta averiguação é fundamental para aferirmos as reais necessidades jurídicas da obra audiovisual, de modo a que estas possam colmatar as necessidades práticas de proteção deste tipo de obras de modo objetivo e eficaz. Esta análise permitirá visualizar se algumas destas qualificações poderão abranger todos os diferentes tipos de obras audiovisuais que aqui serão estudados e se existirá uma qualificação única ou múltipla que permita uma maior proteção. Questões como a definição do objeto de obra audiovisual, sua qualificação e tipificação, não podem ser tratadas sem que se refiram questões tão essenciais como a integridade da obra audiovisual, sua fixação material e importância da sua divulgação. A sua exteriorização e existência física, é fulcral para que se analisem todos os aspetos juridicamente relevantes para a criação de uma proteção fiável, eficaz e capaz de não perecer ao primeiro obstáculo prático com que se depare. Por isso, é também importante conhecer quem são os sujeitos das obras audiovisuais e qual o seu papel na qualificação das mesmas, de modo a que os direitos das próprias obras possam ser devidamente salvaguardados em todas as suas dimensões jurídicas. Além das matérias de direitos de autor, é fundamental tocarmos um aspeto importante da propriedade industrial, ou seja, o merchandising, que abrange alguns tipos de obras audiovisuais. O merchandising não poderá deixar de ser tratado neste âmbito, sob pena de se descurar um importante aspeto de proteção das obras audiovisuais. Paralelamente, estabeleceremos o elo de ligação existente entre o merchandising e a publicidade, dada a sua proximidade real, no que à obra audiovisual diz respeito. Terminaremos a nossa análise com a estruturação dos possíveis regimes da obra audiovisual quer na sua globalidade, quer nos seus tipos específicos, realizando uma análise crítica dos direitos de autor destas obras no Direito Português.

At a time when audiovisual creativity plays a leading role in modern society, it is essential to look at copyright, related rights and industrial property that embody this creativity. We talk about the need to protect audiovisual works, which are more than a mere creation of an isolated human intellect, are also the combination of a plural set of works, whether of achievement, literary, phonographic, visual, graphic, empirical, decorative And stylistic that reinvent themselves through their unification in a single work called audiovisual. Audiovisual works are a vehicle that reflects the cultural matrix of any developed country, given the importance they have in the transmission of values, social and cultural traditions, since they are the preferred means of communication worldwide. Rather than considering audiovisual works as the ignition engine of communication, we must also take into account in the present study that this type of works constitute the memories of the world that materialize a set of unique creative contributions that can not be ignored as a brand And a civilizational legacy that passes from generation to generation, and which allows us to express the evolution / revolution in which we are all imbued beyond the intrinsic communicational message they transmit. Although it is clear and obvious, transnational interest in the treatment of the topic is evident throughout the world literature, in our country there are few references to audiovisual works and the theme is still treated with an enigmatic timidity, a situation that will only be justified by the recent National audiovisual productions, which only began to take place more regularly and more frequently in the last thirty years. This study aims to know if the Code of Copyright and Related Rights when regulating in article 22 the cinematographic work, will not be taking the part for the whole and if it should not exist was a regulation of the audiovisual work in general, Defining within it, all its types, in which the cinematographic work is included. We will also inquire whether the cinematographic work will be the audiovisual work itself or just one of the types of audiovisual work. The answer to this question will be essential in order to determine whether the system for the protection of audiovisual works is based on the paradigm of cinematographic works or whether it is based on a universal concept of audiovisual works. To this end, we will analyze each of the types of audiovisual works and the regime or regimes that are considered appropriate for each of them, in order to know whether it is possible to create an archetype of protection for all manifestations of audiovisual works, or whether From the cinematographic work so that one can create a paradigmatic idea of this type of work. The lack of a single and precise concept of audiovisual works in general can create several gaps in the system of legal protection of audiovisual works. It is also necessary to understand whether it is intuitive to distinguish between the different audiovisual works that constitute one of its types and the audiovisual work as a general concept. The correct identification of the audiovisual work in itself can also make it possible to distinguish fully these works from works that, although differentiable, are likely to be confused with audiovisual works or works that may be on the border line. We will also verify if it is necessary to create a qualification and protection regime for the audiovisual work in general, as well as for its different types, in which the advantages and disadvantages of its designation as collaborative, collective, original and derivative works are analyzed. This inquiry is fundamental to assess the real legal needs of the audiovisual work, so that they can meet the practical needs of protection of this type of works in an objective and effective way. This analysis will make it possible to see if some of these qualifications could cover all the different types of audiovisual works that will be studied here and whether there will be a single or multiple qualification that allows greater protection. Issues such as the definition of the audiovisual work object, its qualification and typification, can not be treated without referring to such essential issues as the integrity of the audiovisual work, its material fixation and the importance of its dissemination. Its exteriorization and physical existence is central to analyzing all the aspects that are legally relevant to the creation of a reliable, efficient and capable of not perishing the first practical obstacle that comes across. It is therefore also important to know who the subjects of audiovisual works are and what their role is in the qualification of them, so that the rights of the works themselves can be duly safeguarded in all its legal dimensions. In addition to copyright matters, it is essential to play an important aspect of industrial property, that is, merchandising, which covers some types of audiovisual works. Merchandising can not fail to be treated in this scope, failing to overlook an important aspect of protection of audiovisual works. At the same time, we will establish the link between merchandising and advertising, given its real proximity to audiovisual works. We will conclude our analysis with the structuring of possible regimes of the audiovisual work both in its entirety and in its specific types, performing a critical analysis of the copyright of these works in Portuguese Law.