Um outro olhar sobre os maus-tratos: representações sociais dos idosos não vítimas acerca dos maus-tratos na velhice

Abstract

O crescente envelhecimento da população contribuiu para a tomada de consciência de um novo problema social – os maus-tratos na velhice, problema que esteve abstruso, durante muito tempo, dada a noção de família como espaço seguro e de afetos. Neste contexto e dado o nosso interesse e preocupação em alargar o conhecimento acerca desta problemática, decidimos debruçar este trabalho sobre as representações sociais dos idosos (indivíduos de 65 e mais anos) acerca dos maus-tratos na velhice, elegendo como principal objetivo a sua descrição e compreensão. Optou-se por um estudo de género e uma análise comparativa de dois grupos de idosos não vítimas de maus-tratos: idosos institucionalizados e não institucionalizados. Para o efeito, procedemos à realização de entrevistas semi-estruturadas e à análise de conteúdo dos discursos dos idosos. Conclui-se que apesar de ainda haver um certo desconhecimento desta realidade, os idosos entrevistados têm algum conhecimento deste fenómeno e das suas consequências, apontando assim a tristeza, a revolta e o desejo de pôr termo à vida, como alguns dos efeitos mais nefastos dos maus-tratos na vida do idoso. O abandono é para os entrevistados o tipo de maus-tratos que mais atinge os idosos, apontando como principais agressores os filhos e familiares mais próximos do idoso. Como principais causas dos maus-tratos, os entrevistados destacam aspetos inerentes ao agressor, nomeadamente a falta de dinheiro ou interesse económico e, aspetos inerentes à vítima, como o comportamento agressivo do idoso, a idade e a incapacidade do mesmo para se defender. De entre as medidas de prevenção e proteção das vítimas os entrevistados destacaram a necessidade de se tratar o idoso com carinho e compreensão como forma de evitar esses episódios, a vigilância como medida de prevenção do fenómeno e a denúncia para pôr fim aos maus-tratos. No entanto, verifica-se através do discurso dos entrevistados que ainda há um grande receio em denunciarem o agressor. Ao eleger como população-alvo os idosos não vítimas de maus-tratos, este estudo distancia-se de grande parte das investigações acerca desta problemática que se centram sobretudo na perspetiva das vítimas.

The growing aging of the population contributed to the awareness of a new social problem – mistreatment in old age, problem that was abstruse, for a long time, given that the notion of family as a safe haven. In this context and given our interest and concern to difuse the knowledge about this issue, we decided to center this project around the social representations of the elderly (individuals with 65 years and over) about the mistreatment in old age, by electing as the main objective their description and understanding. We opted for a study of gender and a comparative analysis of two groups of elderly, non-victims of abuse: elderly institutionalized and noninstitutionalized. To this end, we proceed to the realization of semi-structured interviews and the content analysis of the discourses of the elderly people. We conclude that, in spite of, there being still a certain ignorance of this reality, the elderly respondents have some knowledge of this phenomenon and its consequences, thus pointing to the sadness, anger and a desire to put an end to life as some of the most adverse effects of mistreatment in elderly life. The abandonment is the sort of abuse which the most interviewees refer to as the affecting more elderly people, pointing as the main aggressors the sons and the close relatives of the elderly. As the main causes of maltreatment, respondents highlight aspects inherent to the aggressor, namely the lack of money or economic interest and aspects inherent to the victim, as the aggressive behavior of elderly, age and the inability to defend yourself. Among the measures of prevention and protection of victims, respondents highlighted the need to treat elderly with care and understanding as a way to avoid these episodes, vigilance as a prevention measure of the phenomenon and the denunciation for ending mistreatment. However, it is verified through the discourse of the interviews that there is still a great fear to denounce the aggressor. By electing as target population the elderly non-victims, this study distances itself of the majority of the investigations about this problem, who focus primarily on perspective of the victims.