Mecanismos de conexão frásica: a importância das variáveis sociais

Abstract

O presente trabalho insere-se no domínio da variação sintática e tem como objetivo promover a discussão em torno da importância das variáveis sociais na interpretação dos dados linguísticos. Partindo do pressuposto de que a mesma relação semântica pode ser estabelecida através de diferentes estruturas sintáticas, são analisados os mecanismos de conexão frásica que permitem o estabelecimento da relação de causalidade. Seguindo as propostas de Schiffrin (1987), Sweetser (1990), Paiva (1991, 1996), Paiva & Braga (2010b), propõe-se a tripartição da noção de causalidade em: causa real, causa explicativa, e causa interacional. Esta divisão é motivada por três fatores: tipologia de ato de fala envolvido (assertivo / não assertivo), tipologia de relação estabelecida (asserida ou pressuposta), e domínio de atuação (domínio do conteúdo, domínio epistémico, e domínio ilocutório/interacional). No que diz respeito aos mecanismos de conexão frásica em análise, argumenta-se a favor da categorização destas estruturas em: justaposição, anexação, suplementação, coordenação, e subordinação (Peres & Mascarenhas, 2006). Tendo em consideração o comportamento sintático em testes de escopo e clivagem, entre outros, as estruturas subordinadas são, ainda, subclassificadas em não periféricas e periféricas (Lobo, 2003, 2013). Para além da descrição teórica dos mecanismos de conexão frásica e das relações de causalidade, este trabalho incide sobre a importância das variáveis sociais na explicação dos padrões de ocorrência observados. Neste sentido, foram recolhidos 168 textos: 120 foram redigidos a pedido, mediante uma tarefa de redação, e 48 foram recolhidos em blogues. Os informantes estão estratificados de acordo com o grau de escolaridade (abrangendo informantes a frequentar 1º ciclo do ensino básico a informantes com um curso superior), grupo etário ([9- 10], [11-12], [13-15], [15-19], [20-40] e [≥41]), e género. Os temas sobre os quais versam os textos foram controlados. No caso dos textos redigidos a pedido, os informantes escolheram dois temas de oito disponíveis; no caso dos textos recolhidos em blogues, selecionaram-se aqueles que versavam sobre temas semelhantes aos disponíveis para os informantes do corpus A. Os resultados da análise revelam que as relações de causa explicativa são as mais frequentes, independentemente do corpus em análise. Quando observamos os dados para o cruzamento das variáveis sociais, constata-se que a variável grau de escolaridade influencia a ocorrência da relação de causalidade: informantes com mais anos de escolaridade tendem a estabelecer mais frequentemente relações de causa explicativa. A influência da variável grau de escolaridade (e da variável idade) foi ainda verificada na frequência de ocorrência dos mecanismos de conexão frásica: a justaposição é mais frequente nos textos redigidos por informantes mais velhos e com mais anos de escolaridade. Por outro lado, falantes mais novos e com menos escolaridade tendem a estabelecer a relação de causalidade através de estruturas subordinadas e suplementares. Estes resultados mostram que a noção de que a justaposição é um mecanismo básico de conexão merece ser discutida e aprofundada, principalmente no estabelecimento de uma relação de causa. Neste sentido, o facto de a relação de causalidade ser estabelecida por inferência, sem recurso a um conector explícito, sendo delegado no outro a tarefa de interpretação da relação estabelecida, exige um maior esforço cognitivo de processamento. No que diz respeito ao uso e variedade dos elementos de ligação, destaca-se a ocorrência de porque, principalmente nos textos redigidos por falantes mais novos e com menos escolaridade. Este padrão pode ser explicado pelo facto de porque ser um item de elevada frequência e, simultaneamente, ser apresentado, em contexto escolar, como a conjunção prototípica no estabelecimento de uma relação de causalidade Por fim, não foram encontradas evidências estatísticas que permitam afirmar que os padrões de ocorrência das relações de causalidade ou a ocorrência dos mecanismos de conexão são influenciados pela variável género.

This dissertation falls under the domain of syntactic variation, and aims at promoting discussion on the role of social variables in the interpretation of linguistic data. Assuming that the same semantic relation may be established by means of different syntactic structures, this thesis proposes an analysis of the mechanisms of clausal connection that establish a causal relation. Following the work of Schiffrin (1987), Sweetser (1990), Paiva (1991, 1996), Paiva & Braga (2010b), a tripartite distinction of causal relations is established: real cause, explicative cause, and interactional cause. This categorization takes three factors into consideration: the typology of speech acts involved (assertive / non assertive), the typology of the relation established (assertion or presupposition), and its domain (content, epistemic, and illocutionary/interactional). The mechanisms of clausal connection are classified into: juxtaposition, attachment, supplementation, coordination, and subordination (Peres & Mascarenhas, 2006). Subordinate clauses are also subcategorized into non-peripheral and peripheral (Lobo, 2003, 2013; Haegeman, 2004), according to their behaviour in scope and focus tests. In addition, this dissertation focuses on the importance of the social variables in the clarification of the frequency patterns observed in linguistic data. Thus, 168 texts were gathered and analysed: 120 were written upon request, and 48 were collected from blogs. The informants are stratified according to their level of formal education (from elementary school to university level), age interval ([9-10], [11-12], [13-15], [15-19], [20-40] e [≥41]), and gender. The topics about which the informants wrote were controlled. Informants who wrote the texts upon request could choose two topics from eight available; and texts from blogs were selected according to the themes previously defined. The results of the analysis show that explicative causal relations are the most frequent type of causal relation regardless of the corpus under analysis. When we observe the influence of social variables, it is noticeable that level of formal education influences the occurrence of causal relations: informants with more years of formal education tend to establish explicative causal relations more often. The influence of level of education (and age interval) was also observed in the rates of the mechanisms of clausal connection: juxtaposition is more frequent in older informants and in informants with more years of formal education. On the other hand, younger informants and informants with less years of formal education tend to establish a causal relation using subordination and supplementation. These results show that the notion that juxtaposition is a basic mechanism to establish connections should be called into question, mainly in the cases in which juxtaposition establishes a causal relation. The fact that the causal relation is established by inference, without the assistance of any overt connector, delegating in the other the task of interpreting the semantic relation established, requires a greater cognitive effort in terms of processing. Porque ‘because’ is the most frequently used connective, mainly in the texts written by younger informants and informants with less years of formal education. This pattern may be explained by the fact that porque is a high frequency item and, simultaneously, it is presented, in school contexts, as the prototypical conjunction in the establishment of causal relations. Finally, no statistical evidence was found to support the notion that the variable gender has effects on the patterns of occurrence of causal relations or on the mechanisms of clausal connection.